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Cabeleireiro de Nova Friburgo é alvo de mensagens racistas na internet

Ugrécio Santana, de 34 anos, registrou boletim de ocorrência e denunciou a situação por meio das redes sociais

Por Paula Winter
23/06/20 - 15:08
Cabeleireiro de Nova Friburgo é alvo de mensagens racistas na internet Ugrécio Santana recebeu mensagens racistas em suas redes sociais | Foto: Reprodução/Redes Sociais

Um profissional de beleza de Nova Friburgo, na Região Serrana do Rio, foi vítima de racismo. Ugrécio Santana, 34 anos, é friburguense, cabelereiro há seis anos e especialista em cabelos afro e loiro. O caso veio à público no dia 14 de junho, em uma postagem nas redes sociais.

O rapaz conta que recebeu a mensagem racista, enviada de modo privado em sua conta no Instagram, no dia 8 de junho, mas que pensou muito antes de expor o conteúdo da conversa.

Na mensagem, uma cliente diz que ele “deveria focar mais no segmento de cabelos loiros” porque “nicho afro e loiro não se mesclam” e que “não se sentiria confortável de ser atendida com uma química afro sendo feita ao lado”. Ugrécio expôs a mensagem em um stories e fez um vídeo em que comenta esse e outros episódios de racismo sofridos por ele ao longo dos últimos meses.

Print de uma das mensagens racistas recebidas pelo cabeleireiroPrint de uma das mensagens racistas recebidas pelo cabeleireiro | Foto: Arquivo pessoal/Ugrécio Santana

“Além da mensagem, há três semanas atrás, uma outra cliente havia nos procurado dizendo que queria fazer um procedimento no cabelo. Ela disse assim: eu não quero que aquela neguinha lá lave o meu cabelo. Aí eu respondi a ela que ‘se a neguinha não ia lavar, que o neguinho aqui também não ia’”, conta.

Ainda no vídeo, Ugrécio fala sobre outro acontecimento envolvendo uma digital influencer de Nova Friburgo.

“No início do ano, uma blogueira da cidade nos procurou, querendo fazer uma parceria. Até seria muito bom para ambas as partes, porque é uma coisa normal nesse mundo de internet ter alguém para divulgar o nosso serviço. Só que o cunho foi muito racista. Ela dizia que ela tinha um público branco, um público mais elitizado que ela traria para o meu salão”, explica.

Os casos expostos pelo cabeleireiro geraram repercussão nas redes sociais, mas as mensagens racistas não pararam.

Teve gente dizendo que eu estava fazendo sensacionalismo. E o que mais me chocou, de verdade, foi envolverem a minha filha, dizendo que ela seria catadora de piolho de pobre igual ao pai.

As mensagens racistas já foram denunciadas à polícia. Entretanto, apesar de ter tomado as providências legais, Ugrécio, além do racismo, lida com outro problema: o anonimato que a internet proporciona.

“Acionei os advogados aqui do salão e eles já fizeram o boletim de ocorrência. Só que crime de internet assim é muito difícil. A maioria das mensagens que a gente recebe, que a gente está recebendo, são de perfis fakes”, conta.

O cabeleireiro destacou que lida com o racismo desde que se entende por gente, mas que isso não torna a situação mais fácil de lidar. E apesar de todos os problemas enfrentados nos últimos dias, o profissional de beleza deixa uma mensagem às pessoas que o atacaram.

“Fui parar no hospital, foi a pressão que não regulariza, não consigo dormir, não consigo comer. A gente tá muito chocado, muito abalado diante disso tudo. Então, o que eu tenho para dizer? Eu nem sei, mas eu acho que eu perdoo”, finaliza.

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não vou me calar !

Uma publicação compartilhada por Ugrécio Santana (@ugreciosantana) em

Crimes de racismo

No Brasil, a Lei 7.716/89 trata especificamente de crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. Crimes de racismo e injúria racial não se confundem.

A assessora jurídica do Ministério Público do Rio de Janeiro, em Nova Friburgo, Rebeca Cardoso Eyer, explica a penalidade para cada situação.

“O crime de racismo é imprescritível e inafiançável. A pena imposta àquele que comete este tipo de crime varia e pode chegar até cinco anos de reclusão e multa. A injúria racial, quando há ofensa à dignidade ou o decoro utilizando elementos de raça, cor, etnia, religião, origem ou condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência, o pagamento de fiança é permitido e a sua prescrição se dá em oito anos. A penalidade imposta pelo legislador a quem pratica esse crime é pena de reclusão de um a três anos e multa”.

Sobre o caso do cabeleireiro Ugrécio Santana, a assessora jurídica do MPRJ destaca que a atitude de registrar o caso é correta.

“É muito importante lembrar que as vítimas não devem jamais se calar diante de qualquer situação e, principalmente, que não tenham vergonha ou medo. Crimes precisam ser combatidos, a lei existe para que seja cumprida e o Judiciário está pronto para fazer valer dentro dos limites constitucionais que lhes são inerentes e garantidos por lei”, afirma.

As denúncias devem ser feitas na delegacia mais próxima. Com a pandemia, o boletim de ocorrência pode ser registrado online. A especialista em Direito Constitucional orienta ainda que a vítima apresente informações e mensagens quando o crime é virtual.

“Se o crime foi cometido por meio de redes sociais como ‘Facebook’ e ‘Instagram’, é necessário que a vítima apresente o print das mensagens/áudios recebidos, bem como cópia do perfil que o autor dos fatos utilizou para praticar o delito. O mesmo vale para o ‘WhatsApp’, que nesse caso, também é fundamental que o número de telefone utilizado seja fornecido e entregue junto com as demais provas”, finaliza Rebeca.

Racismo em Nova Friburgo

Mas para a presidente do Centro Cultural Afro Brasileiro Ysun-Okê e presidente da Colônia Pan-Africana de Nova Friburgo, Ilma Santos, a legislação nem sempre é efetiva no combate aos crimes de preconceito e que as redes sociais dificultam ainda mais o diálogo e a compreensão sobre um tema tão sério.

“A legislação deixa brechas para interpretação dúbias, de acordo com interesses e necessidades do momento. Já a internet, em algumas situações, potencializa isso, pois o racismo sempre existiu. A rede social deu visibilidade a este crime hediondo sem que as pessoas parassem para discutir o assunto de forma consciente e focada”, frisa.

Ainda de acordo com Ilma, atitudes e discursos racistas não são casos isolados, mas estão presentes no dia a dia do município. “Há racismo em Nova Friburgo, com certeza. Em alguns momentos velados e em outros devido à impunidade”, comenta.

Para ela, falta entendimento por parte da sociedade de que a questão do racismo é histórica, e só poderá ser resolvida com a reparação dos erros do passado.

“Que todos entendam que o racismo é um processo excludente histórico com a finalidade de beneficiar grupos específicos dentro de um processo político. Não falo de partidarismo, falo da necessidade de equidade e reparação para um povo historicamente discriminado”.


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