Afinal, a polícia pode dar voz de prisão a quem estiver na rua sem necessidade?
Advogado explica se a posição da 151ª DP (Nova Friburgo) tem respaldo na lei durante a pandemia do novo coronavírus
03/04/20 - 14:31
Um comunicado na página do Facebook da 151ª Delegacia de Polícia (Nova Friburgo), publicado na quinta-feira, 2, dividiu opiniões entre a população friburguense.
A postagem, assinada pelo delegado Henrique Pessoa, afirma que pessoas que forem às ruas “sem objetivo justificável” poderão ser conduzidas à delegacia. Ainda segundo o texto, as mesmas poderão ser indiciadas.
De acordo com a publicação, o embasamento para esse tipo de medida estaria no artigo 268 do Código Penal.
O artigo trata de infração de medida sanitária preventiva e diz que quem infringir determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa, está sujeito à pena de detenção, de um mês a um ano, e multa.
A pena é aumentada de um terço, se o agente é funcionário da saúde pública ou exerce a profissão de médico, farmacêutico, dentista ou enfermeiro.
Publicação na página da 151ª DP (Nova Friburgo) no Facebook, assinada pelo delegado Henrique Pessoa | Imagem: Reprodução/Facebook
Depois da repercussão da postagem, a 151ª DP se pronunciou, mais uma vez, nas redes sociais para explicar à população sobre a medida.
“É oportuno ler atentamente que existem motivos justificáveis para ir à rua. Obviamente que não haverá detenção ilegal de trabalhadores em trânsito, cidadãos indo às compras inevitáveis à farmácia, visita a médicos etc”, diz trecho da nova publicação.
De acordo com a delegacia, a medida tem o objetivo de manter a saúde e a vida da população.
“Não somos contra que as pessoas realizem suas necessidades. O que desejamos é que respeitem as regras das autoridades sanitárias, desejando que a sociedade supere esse momento com a menor perda de vidas possível. Se não for absolutamente necessário ir à rua, fique em casa!”.
O que diz a legislação?
A reportagem do Portal Multiplix conversou nesta sexta, 3, com o advogado Bruno Silva, que explica que o artigo 268 do Código Penal pode sim ser aplicado na atual situação.
“O delegado pode sim levar alguém à delegacia, com base no Código Penal, como diz a publicação da 151ª DP, pois nós estamos em estado de calamidade”, afirma.
Ainda de acordo com Bruno, diversas medidas provisórias, leis e decretos vêm sendo publicados pelas três esferas de governo visando à saúde da população e a diminuição dos impactos econômicos da crise de covid-19. E que quando a população não segue as orientações das autoridades competentes, o estado pode intervir no direito de ir e vir.
As pessoas não estão respeitando essa situação de não aglomeração. Então, no mundo do direito, nós não podemos apenas entender o que está escrito em leis. O mundo do direito também é feito por coerência, prudência, razoabilidade e, acima de tudo, bom senso.
O advogado reforça ainda que a situação é temporária e garante a segurança das pessoas. Além do Código Penal, a Constituição fala também sobre mudanças no dia a dia devido a situações específicas ou atípicas.
“A liberdade de locomoção, ela não é um direito absoluto. Diante de uma situação de emergência, ela pode ser mitigada”, finaliza.
O que diz a Polícia Militar?
Além da polícia civil, a polícia militar também está atuando na fiscalização das ruas. Em nota ao Portal Multiplix, a Secretaria de Estado de Polícia Militar informa que, desde o dia 21 de março, quando o decreto estadual 46.980 entrou em vigor, há aplicação de um esquema diferenciado de policiamento, no combate à proliferação do covid-19.
“Os policiais militares estão instruídos a empregar um modelo de polícia de proximidade que prioriza a conscientização e o diálogo nesse contato com os cidadãos, convencendo-os de que a luta contra esse inimigo invisível é uma responsabilidade de todos”, diz a nota.
Segundo a PM, o agente público de segurança está autorizado a dar voz de prisão e levar a pessoa à delegacia.
“Em caso de insistência por parte do cidadão em não obedecer às restrições do decreto, o policial militar irá determinar seu fiel cumprimento e, caso não seja atendido, poderá lhe dar voz de prisão e conduzi-lo à delegacia de polícia para apresentação à Autoridade Policial”.
A polícia reforça que a maioria expressiva da população vem colaborando com a equipe e que, até o momento, não há números relevantes de conduções ou ocorrências originadas diretamente deste trabalho.