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Há controvérsias

Por George dos Santos Pacheco
08/02/23 - 09:50

“Pessoas que são boas em arranjar desculpas raramente são boas em qualquer outra coisa.” (Benjamin Franklin)

Vocês precisavam ver que festa bonita. Estávamos todos a rigor, os homens em black tie e as mulheres em habillé, penteados estilosos, sorrisos amarelos, maneirismos exagerados. Canapés, drinks e lounge como música de fundo. “O que eu estou fazendo aqui?”, murmurei para Dona Maria, com os dentes cerrados para disfarçar e levei uma cutucada com o cotovelo na costela. Foi nesse momento que os anfitriões da festa pediram atenção para fazer um anúncio. Houve palmas, assovios e o meu já sacramentado “como é que é?”. E mais uma cutucada na costela.

Acontece que os donos da festa, já pra lá de Bagdá (Marrakesh ou Eirunepé, você escolhe) anunciaram uma nova gravidez. Que bacana! Até aí, tudo bem, fico feliz por eles. Contudo, na intenção de justificar a distância de uma concepção para a outra (o filho mais velho tinha dez anos) o casal afirmou: “aconteceu”. “Como é que é?”. Há controvérsias, desconfiado leitor.

Vê bem. Certa feita, um camarada bateu na traseira do meu carro, no meio do trânsito do centro da cidade. Não foi nada demais, não danificou nada. Mas na hora em que saí do carro para ver, da mesma maneira que o outro motorista ele se justificou com “aconteceu”. Ora, rapá. Aconteceu? Que história é essa de “aconteceu”? Então ele não me viu? Como não me viu?

Vamos lá. Para começo de conversa, se o camarada sai de casa de carro, ele assume o risco de qualquer evento após isso, ele está sujeito a essas coisas. Então, não “aconteceu”. Meu carro não surgiu feito mágica na frente dele. Se ele bateu na traseira do meu carro, algo o motivou a isso, ele se distraiu com o celular, com uma mulher caminhando na calçada, ou qualquer outra coisa. Mas dizer que “aconteceu” desvia a responsabilidade pelo ato para algo metafísico, caso fortuito, como se fôssemos meros atores influenciados pelo tear das moiras. Não somos.

Entendem meu estranhamento toda vez que alguém diz “aconteceu”? No caso dos amigos do primeiro parágrafo, por exemplo. Os camaradas engravidam e dizem que “aconteceu”, cacetas? A essa altura do campeonato já estamos todos carecas de saber de onde vêm os bebês. Façam-me o favor. Se o camarada sai de carro, ele assume o risco. É um eufemismo descarado e sem sentido simplesmente dizer que aconteceu.

É exatamente a mesma coisa quando chove em Nova Friburgo, nessa época do ano. A cidade é um vale no meio da serra, e a estrutura de diversos bairros segue a mesma lógica no relevo, são pequenas depressões ou planícies entre morros. É então, natural, quando numa borrasca de verão, as águas desçam dos montes e se acumulem na parte mais baixa. Não é? Subir o morro é o que a água não vai fazer. E isso desde que o mundo é mundo, desde que essas terras eram habitadas pelos puris e guayacazes; desde que os portugueses, suíços, alemães, austríacos, espanhóis, húngaros, italianos, japoneses, libaneses, e pan-africanos (faltou mais alguém?) estiveram por aqui. Então, não há nenhuma novidade quando chove feito ontem e ruas se alagam, árvores caem, morros desabam. Aconteceu? Há controvérsias.

Não tem desculpa, cara pálida. Se sabemos disso tudo, se somos inclusive informados pelos serviços de meteorologia, como justificar a falta de atitudes (de cidadãos e autoridades) que possam inibir maiores danos ocasionados pela chuva? Aconteceu? Então a culpa é do tempo, de alguma entidade metafísica, das moiras, do destino? Não é, não. E todo mundo já está careca de saber disso.


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