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Aquilo que ninguém vê

⁣⁣

Por George dos Santos Pacheco
11/10/23 - 09:12

“O poeta é capaz de ver pela primeira vez o que, de fato, ninguém vê.” (Otto Lara Resende)

Esses dias, quando eu voltava do trabalho, as esponjas estavam todas abertas. Não sabe o que é esponja, desconfiado leitor? A Calliandra brevipes é uma espécie de arbusto bastante ramificado e denso, cujas flores se apresentam em capítulos do tipo pompom. É a tal da “esponjinha”. Lembrou agora? Pois a planta, muito utilizada como cerca viva em nossos rincões, segundo a sabedoria popular, floresce quando está para chover. Mas quem é que em nossas tardes tão velozes se dedica a observar flores, arbustos e gente por aí, no caminho de casa?

Vivemos uma era em que somos constantemente bombardeados por informações, numa rotina tão intensa de ações, que tudo acontece muito rápido e ao mesmo tempo. Quantos de nós realiza inúmeras tarefas ao longo do dia e mal percebe como as concluiu?

Guardei o carro e ergui o olhar para o céu. Não havia nenhuma nuvem. Nem vento corria. Como, então, que ia chover? Pois choveu, terráqueo. Acordei de madrugada ao som da chuva, uma chuva torrencial de início de primavera. Uma chuva que somente as esponjinhas esperavam.

Talvez não esteja tão claro o que pretendo dizer, atentíssimo leitor, mas apresso-me a explicar-me: já se pegou chegando em casa e refletindo sobre o trânsito, não se recordando dos detalhes do trajeto? Não? Está bem, vou acreditar em você. Reste claro que é disso que se trata. A rotina e o automatismo interferem nas relações sociais, assumindo em nossa geração proporções grandemente nocivas. Isso acontece não apenas no caminho do trabalho para casa, mas numa simples conversa com um colega de trabalho, com os filhos e com a esposa. Tem cabimento isso? Não tem. Contudo, é mais comum do que buraco em via pública.

Não é sobre esponjinhas, sobre as cercas vivas, o paisagismo, ou sobre as chuvas (nem tão) repentinas e inesperadas. É sobre essa leitura dinâmica e superficial de nossos tempos, o fantasma da indiferença.

Temos o olhar banalizado pelo hábito. Vemos não vendo. Para isso, Otto Lara Resende nos chama a atenção em sua crônica “Vista Cansada”, publicada em 1992: “ O problema é que, de tanto ver, a gente banaliza o olhar”. De tanto ver, de tanto viver, de tanto sentir. Banalizamos a tudo e a todos.

É preciso, desde já, (re)aprender a enxergar, a ouvir, a falar, como uma criança, para a qual tudo é novidade, como o poeta que é capaz de ver pela primeira vez o que ninguém vê, porque nunca uma sociedade foi tão carente de atenção, mesmo as pessoas vivendo tão próximas umas às outras.


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