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Sobre o Ódio e a Razão

Por Ricardo Lengruber
15/04/19 - 09:41

A sensação que temos hoje é que vivemos uma contradição absurda. De um lado, a ditadura dos fatos - a ideia de que só se deve levar em consideração o que os números, os dados e a realidade objetiva indica. De outro, a negação desses mesmos fatos - sob a lógica ideológica de valores circunscritos a determinados círculos; ou seja, a ideia de que, se discordamos de algo, temos todo direito de fazê-lo, mesmo contrariando as evidências e teorias mais consistentes que há nas mais diversas áreas do saber. E tudo sob a desculpa do “viés ideológico”.

Há em curso no país (talvez no mundo), uma onda de ódio promovido pelas discordâncias ideológicas. Os campos do embate político se tornaram arenas de cerceamento de liberdades e assassinatos de reputações.

Há em marcha uma espécie de banalização do saber; uma desconsideração com a análise cuidadosa sobre os fatos e problemas. Um certo desdém com a ciência, com a filosofia, com o esforço intelectual. Mais que isso: às vezes, ocorre uma criminalização da reflexão. Como se pensar e dar espaço para a dúvida e para o contraditório fossem pecados. A lógica de um pensamento único é puramente pragmático é irmão da ignorância. Não há saber se não houver dúvida, instabilidade, inconclusões e pluralidade.

O ódio é uma face da irracionalidade. Em algum sentido - ainda que isso o explique apenas em parte - o ódio é um subproduto de uma sociedade cansada da racionalidade excessiva e excludente.

Desde os gregos clássicos, passando pela escolástica, pelo cartesianismo e, mais recentemente, pelo positivismo, a ênfase na razão pela razão, exclusivamente a razão, fez com que negligenciássemos os aspectos lúdicos e imaginativos da cultura humana. Mais que da cultura, da própria natureza.

Resultado disso tem sido, nesse início de século, um resgate dos aspectos irracionais sem a devida densidade humana e civilizatória. E mais: um cansaço generalizado com discussões mais sofisticadas sobre direito, humanização, cultura e tolerância.

Há traços claros de renascimento das narrativas de heróis e das epopeias irracionais graças ao desencantamento com a ciência e a política tradicionais.

A psicologia perde espaço para a PNL, a política para as redes sociais, a medicina para as orações e a literatura para os memes.

Há em curso um reencantamento do mundo. Por vias equivocadas, talvez. Mas somente as consequências (cujos aperitivos já estão por aí revelando seu apelo) mostrarão a realidade. E somente elas terão eventualmente alguma chance de promover mudança.

É curioso mas o excesso de discursos nas redes e nas ruas parece ser símbolo de mais racionalidade. Mas não é. É exatamente o oposto. Há crenças absurdas voltando a cena. Governantes acreditando hoje que a terra é plana, só pra ficar num exemplo. Muito discurso e pouca reflexão consistente.

O desafio que temos é tornar a razão e sua potência em algo que promova conscientização e transformação. Mas sempre e ao mesmo tempo respeitando a dimensão simbólica da humanidade. Se não aprendermos a combinar razão e emoção, não avançaremos. Ao contrário continuaremos regredindo.

Além disso, reconhecer que o problema do saber está exatamente naquele ponto final em que se supõe ter chegado. Na falsa convicção de se ter alcançado a verdade. Quem estaciona nessa segurança, além de perder a experiência e a vitalidade da dúvida permanente, deixa de enxergar a pluralidade e as incertezas das coisas - que são, no fundo, sua beleza. É na impermanência que mora o sentido da vida.

Por isso, a Educação deve conjugar necessariamente liberdade de quem ensina e liberdade de quem aprende. Para isso, os que ensinam devem garantir que os que aprendem tenham voz também. Quando isso ocorre, há um imenso caminho aberto para que se construa o diálogo. E onde há respeito pelos saberes compartilhamos de quem aprende e de quem ensina, há crescimento de todos.


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